top of page

   Bem que avisaram. Ao escolherem o estranho nome de FERA RADICAL para o título de sua nova novela das 6h da noite, a Rede Globo estava apenas sendo explícita. E informando uma nova tendência neste seu antigo horário. No qual dá uma pausa no açucarado histórico e resquícios latinos, entrando firme no melodrama apimentado, moderninho e com a atual estética americana. Enfim, entra de sola num mercado dominado por produções tipo Dallas e Dinastia, tentando um caminho internacional nos mesmos moldes e estilo. Mas se não conseguir vende-lo lá fora, já lucra aqui, porque, também sem meio termo, como comunicou, loteou todos os espaços e tempos desta produção ao merchindinsig agressivo e total. Claramente, portanto, a opção atual da emissora é pela fauna extremada. Exposta com o pragmatismo habitual da Globo no primeiro capítulo de FERA RADICAL.

 A abertura da novela é um longo e explícito anúncio de motocicleta. Da mesma marca que ganhou igual espaço em ROQUE SANTEIRO. A segunda imagem é de uma firma de informática repleta de máquinas também assinadas. O corpo de Bombeiros, que não deve ter dinheiro para estas coisas, não conseguiu se meter no merchindising do início da história quando a mocinha lembra de sua família torrada por incêndio criminoso.

  Os prováveis criminosos moram na réplica tupiniquim de fazenda de Dallas. Como ainda falam português, embora a música de fundo seja country e não sertaneja. E há uma festa e um leilão de gado, parecendo que o autor, Walter Negrão, também lembrou muito da UDR ao estruturar sua história.

  O patriarca ruralista é Paulo Goulart numa cadeira de rodas. Este detalhe é bem antigo, vem desde os tempos de Lionel Barrymore. Sua companheira é a Yara Amaral, que rosna por não ter casado com o dito em 40 anos de convivência. Dizem que pobre adora imoralidade de rico e a estação sempre capricha neste ponto.

  Chega então a sensação “o sassarico” vestido de vaqueiro. Gregory Peck em “Duelo ao Sol” incorporado por José Mayer. Ele parece ainda estar nos “Bandidos da Falange”, mas ninguém lhe resiste. Tanto que logo leva a prometida do irmão, em plena cerimônia de noivado, para um celeiro ou estábulo, não tenho muita certeza e oh! Isto mesmo, transa da explícita. Me lembrou da piada do sujeito que nada tinha contra relações sexuais antes do casamento desde que não atrasasse a comemoração litúrgica. E o mesmo sedutor ainda recebe uma cantada de sua sobrinha menor, provando que realmente, depois de MANDALA, a família brasileira não é mais a mesma.

  Enquanto isso, chega na fazenda a vingativa Malu Mader, fantasiada de Marina, a cantora, e conversa com o corneado Thales Pan Chacon. O noivo irmão. Um papo também esquisito, tipo aí tem coisa, só atrapalhado pela profissão dela, operador de sistema, que ninguém ainda sabe falar com naturalidade.

  Mas a versão cabocla de Dallas é mesmo extremada. Pois até pobre, que antigamente tinha que ser bom para se identificar com o expectador, também não vale nada aqui. A outra menor, vivida por Alexandra Marzo, a bonitinha filha de Betty Faria e Cláudio Marzo, já transa também com o neto dos ricos, numa relação explicitamente neurótica.

  Seus pais e os pensionistas da sua casa também são mostrados como oportunistas totais. Que humanidade. Numa ousadia que me parece equivocada e inédita em todo o mundo para tal horário. A estação vai receber reclamações e parece estar catucando com vara curta uma censura prestes a morrer. Amansando a Fera e sendo menos Radical nos anúncios e influências americanas, podem salvar ainda a novela.

Fauna Extremada, a Opção da Globo

(Maria Helena Dutra - O Dia - 30/03/1988)

bottom of page