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JOSÉ MAYER

No dia 29 de abril de 2004, nós estivemos no Teatro Dulcina, no Rio de Janeiro, e fomos gentilmente recebidas pelo ator José Mayer, que estava em cartaz com a tragédia grega MEDEIA, onde interpretava Jasão. Nos bastidores do teatro, ficamos sabendo um pouco mais de sua carreira. Simpático e bem humorado, o ator conduziu a entrevista de forma muito natural e espontânea. Foram momentos muito agradáveis, que dividimos com vocês:

 

 

 

SITE – Zé, em 1988, quando você estava gravando FERA RADICAL, tinha acabado de fazer a minissérie O PAGADOR DE PROMESSAS, do Dia Gomes. Conte como surgiu o convite para fazer a novela, já que o personagem Fernando Flores te alçou à figura do galã, lhe rendendo uma série de protagonistas. Teria sido o Fernando um presente pelo seu desempenho tão elogiado na minissérie?

 

ZÉ – Quando eu fiz O PAGADOR DE PROMESSAS é que eu dei o salto de posição. Até a minissérie eu era um coadjuvante com boas oportunidades. Em 1986 eu estava no meio de uma novela que se chamava HIPERTENSÃO, novela das 19h. Entrei no meio dessa novela para dar um reforço no elenco masculino, por volta do capítulo 70, com um personagem chamado Raul. Eu estava em São Paulo filmando A DAMA DO CINE SHAMGAI quando o Paulo Ubiratan me chamou para fazer essa participação. Me lembro que o salto para O PAGADOR DE PROMESSAS aconteceu de uma maneira intuitiva e completamente irracional. Eu estava nos corredores da TV, antes ainda de fazer HIPERTENSÃO, porque o Wolf (Maia, diretor) me chamou para fazer um papel importante já do início da novela, um motorista chamado Laertes, que Paulo Betti acabou fazendo. E ali naqueles corredores da televisão, vi alguém conversando com Dias Gomes por telefone, aí eu me atrevi, pois sabia que O PAGADOR ia ser feito, e pedi a pessoa o fone dizendo que eu precisava falar com o Dias. Aí eu falei “Dias, eu acabei de fazer o remake de SELVA DE PEDRA, eu fiz o Caio, você sabe quem eu sou, Zé Mayer”. Eu queria me oferecer para fazer O PAGADOR DE PROMESSAS, aí ele disse que me conhecia, que tinha visto meu trabalho em SELVA DE PEDRA, que eu era um ator denso, dramático, mas que não sabia se eu teria leveza suficiente para fazer o Zé do Burro. Conversa vai, conversa vem, me sugeri para fazer um teste. Paulo José fez esse teste comigo no Parque da Cidade. Eu decorei um monólogo do Zé do Burro, fui lá e gravei com o Paulo José. Fui o único teste do PAGADOR. Ele aceitou.  Fui escalado e viajei para a Bahia em 1986, mas em razão de lutas sindicais no Rio, o projeto foi cancelado. Eu já estava em Monte Santo, na Bahia, mas acabei voltando. Pensei “que falta de sorte, logo agora que eu ia fazer meu primeiro protagonista”. Um ano depois, em 1987, eu já tendo feito a participação em HIPERTENSÃO, o projeto foi retomado, mas com direção de Tisuka Yamasaky, não mais Paulo José e falei “dancei, né? Outra direção, outros critérios”. Mas a Tisuka viu o teste que eu tinha feito, aprovou de novo e lá fui eu para Monte Santo pela segunda vez. Fiz o PAGADOR e a partir daí minha vida realmente mudou, as oportunidades começaram a vir com personagens mais consistentes e o Fernando Flores inaugurou essa maravilhosa colheita. Foi meu primeiro protagonista em novela. Então essa é a nascente em Fernando Flores. De comum entre Zé do Burro e Fernando Flores existe o cavalo (risos).

 

SITE – Fale um pouco sobre FERA RADICAL

 

ZÉ – Eu me lembro de um elenco fabuloso, amicíssimo, pessoas importantíssimas de quem sou amigo até hoje e foi uma novela excepcional. Eu nem compreendi bem a natureza do sucesso da novela, mas talvez se deva a muita gente talentosa, como Malu Mader, belíssima, Cláudia Abreu,... e estranhamente muita gente que faleceu de maneira trágica. Eu lembro de todos. Isso é uma coisa sinistra em torno de FERA RADICAL. Mas aquelas pessoas todas, mesmo as já falecidas, viveram naquela época, naquele ano de 1988 um período riquíssimo. Gonzaga Blota, saudoso Gonzaga Blota, um mestre da televisão. Denise Saraceni, que dirigia junto com o Blota, Paulo Goulart, Yara Amaral, Thales Pan Chacon, George Otto, Carla Camurati,... Um elenco fabuloso. E ali eu comecei a me tornar um cavaleiro às custas da novela, né? Já cavalguei tanto de lá para cá. Não podem ver uma cela que me escalam. Não podem ver passar um cavalo que eles falam “José Mayer”. Já cavalguei muito (risos).

 

SITE – Os atores da novela pareciam muito entrosados, talvez pelo fato de viajarem juntos para gravar fora da cidade. Como era o clima nos bastidores?

 

ZÉ – A gente gravava muito em Vassouras, mas sobretudo a gente gravava na Rural-Rio, em Paciência. Ali naquele parque a gente gravava frequentemente. Eu não sei a que atribuir esse entendimento, essa afinação da equipe. A direção é que estabelece um pouco isso, o clima da direção. Parei muitas vezes com o Blota para beber uma boa cachaça, era maravilhoso. Éramos amigos de fato.

 

SITE – Você lembra de algum fato curioso nas gravações?

 

ZÉ – Eu levei um tombo do cavalo, passei por maus pedaços, engordei até. Essa sequência eu me lembro: meu personagem estava apostando corrida com a personagem da Malu Mader. Malu de moto e eu a cavalo. E o Blota falou “Mayer, ali você faz aquela curva e entra naquela ponte de madeira”. Olha, você não imagina o que é um cavalo galopando e fazendo uma curva numa ponte de madeira. É impossível, eles não fazem isso. Eu sei que saímos da ponte, o cavalo e eu, ele caiu tombando pelo lado direito, a minha perna direita ficou debaixo dele e nós dois aímos patinando. A minha calça jeans furou no joelho, eu destruí o joelho, não sei como é que eu consegui. Levantei do cavalo e falei “grava, grava!”, machão né? – risos – Grava, continua”, e o cavalo lá, não conseguia, estava todo torto. Terminamos o take, fomos para um hospital ali na área e me dei muito mal, demorei muito a me recuperar. O VÍDEO SHOW tem esse tombo, eu vi uma vez e é horroroso, né? Eu fiquei mancando depois por muito tempo, fiquei limitadíssimo e era um personagem de muita ação, um personagem heroico, eu precisava ter um mínimo de desenvoltura, mas demorei muito a me recuperar, fiz fisioterapia. Tombo de cavalo é muito perigoso. Eu tenho medo e um profundo respeito pelo cavalo.

 

SITE – Zé, em 1992 foi feita uma pesquisa para eleger o casal de maior química que estava no ar. FERA RADICAL era, então, reprisada no VALE A PENA VER DE NOVO. Curiosamente, você e  Malu Mader foram os mais votados, mesmo concorrendo com novos casais de novelas inéditas. Você a Malu tinham uma ótima química, um baita entrosamento em cena. Como foi trabalhar com a Malu?

 

ZÉ – Que maravilha essa pesquisa! Quantas vezes eu trabalhei com a Malu? Só dessa vez?

 

SITE – Além da novela, vocês fizeram dois episódios de A VIDA COMO ELA É.

 

ZÉ – Exatamente. Nunca mais fizemos novela. Olha, a Malu é uma força da natureza. Antes de ser atriz ou qualquer outra coisa, Malu é uma mulher admirável, eu acho, sobretudo, isso. Ainda hoje ela tem um carisma imenso, muito forte e é uma pessoa descomplicada, uma pessoa de cuca aberta, então nesse caso o jogo do ator fica facilitado, a relação é simplificada. Eu tenho boas lembranças. Era muito legal. Questão de afinidade de grupo mesmo, uma coisa meio fortuita, acaso. Se tivessem feito uma pesquisa prévia para saber que ator combina mais com qual atriz, qual o grupo mais a fim um do outro, eles teriam chegado a esse grupo. Foi uma química que o acaso juntou.

 

SITE – E como era a recepção do público na época?

 

ZÉ – Já era paixão mesmo, muito forte. Eu achava meio desproporcional ao horário, que novela das 18h, em geral, não causa uma paixão tão grande. Talvez a modernização do horário, que geralmente apresentava uma novela de época. A GATA COMEU é outro fenômeno que eu não entendo. O Édson foi meu personagem mais bronco (risos).

 

SITE – Muitos atores de FERA RADICAL já faleceram, como você mesmo disse anteriormente. Fale um pouco desses colegas.

 

ZÉ – São mortes trágicas que eu não consigo entender o porquê. Talvez porque o destino fique avisando a gente assim “não pense que tudo são flores”. É o maior sucesso, um sucesso inexplicável, mas preste atenção, tem também um signo trágico em torno de FERA RADICAL. É muito estranho o Cazarré ter morrido de bala perdida, a Yara Amaral no acidente do Bateau Mouche,... Luiz Maçãs, George Otto, Thales, Cláudia Magno... É sinistro, é uma ironia da vida. Às vezes a vida faz isso com a gente. Alguma coisa que é motivo de felicidade pra você, mas tem um parênteses, um toque te avisando de que tudo na vida é provisório, tudo é reltivo. O maior sucesso às vezes é tão importante quanto o maior fracasso. Eu tenho uma visão da vida com uma total subjetividade, com total relatividade. Não enlouqueço mais com o sucesso e também não fico deprimido nem me deixo abater demais pelo fracasso, pelo erro. Eu acho que são dois lados de um mesmo fato e essa história de FERA RADICAL, essas mortes trágicas todas, para mim, são um pouco esse aviso, essa lembrança dos nossos limites. Mas apesar de tudo isso, dessa tragicidade toda, FERA me traz belíssimas lembranças e é a única novela que eu vejo que tem fãs tão apaixonados.

 

 

Agradecemos ao ator tamanho acolhimento e agradável bate-papo.

                                         

                               Novela FERA RADICAL

                                                                                                                  Contato: feraradical88@terra.com.br

                               Rede Globo de Televisão

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